« O Pico é uma ilha muito especial » - confessava um turista holandês, em passeio pedestre por esta ponta da Ilha.
O cavalheiro, numa curta conversa com o meu vizinho benfiquista, desejou-lhe boa sorte para o embate com o Twenta, pois o clube da sua simpatia era o Ajax.
Nesta pequena localidade de veraneio, virada a leste e com vista muito aprazível para São Jorge e Terceira, parece que a nossa mundividência se limita a um « horizonte fechado » (título de um livro do jornalista Raúl Rego, publicado na década de 60, para exprimir a miopia nacional face à corrente democrática que dominava na europa ocidental).
Felizmente, hoje, os nossos horizontes são bastante largos e, num clic, estamos ligados ao mundo via TV e net.
Esse salto brutal abala, constantemente, a consciência dos cidadãos mais idosos de ilhas como esta, classificada, pela sua beleza natural e por um silêncio ensurdecedor que afeta, psicologicamente, os impreparados para o isolamento.
O impacte da tarepia que muitos visitantes estrangeiros aqui procuram para curar-se do bulício das metrópoles, leva-nos a refletir nas vantagens dos pequenos lugares, fronteira da Europa onde a crise parece ter vindo para ficar, por falta de novos rumos e de novas ideologias.
Há dias, li uma extensa reportagem no « Público » sobre o futuro do PS e da social-democracia. Posta de parte a terceira-via que alguns líderes europeus adoptaram como resposta às novas questões europeias, parece não existir, no horizonte mais próximo, uma ideologia política que responda à crise, e nos traga novas soluções para o cancro do neo-liberalismo agonizante que arrastou a economia mundial para o abismo, de onde é difícil sair.
A Europa está a virar à direita, (a seguir, provavelmente, será a Espanha), mas não se vislumbra nada de novo, nem à direita nem à esquerda, que contagie o pensamento político, comprove a eficácia das decisões governamentais e congregue os cidadãos num projeto nacional e europeu, forte e promissor.
Os governos atuais regem-se por um pragmatismo, sem conteúdo ideológico, em favor de um economicismo desumanizado. Menospreza-se valores fundamentais como: o direito à vida, ao trabalho, à saúde, à educação, à habitação e à afirmação das capacidades pessoais de cada um e função social do estado e releva-se a iniciativa privada, o capital, a precariedade laboral, a livre iniciativa, sem peias nem leis.
Os executivos transformaram-se em agências de contabilidade pública. Os titulares dos ministérios são escolhidos pela competência economicista e capacidade de cortar despesas e despedir pessoal e não por uma nova visão humanista, social e política.
Os governos parecem mais escritórios de recebedoria e contabilidade pública que instituições democráticas ao serviço do desenvolvimento e do bem comum.
Observando isto, os cidadãos vivem sem esperança, ameaçados por mais contribuições e hipotecas a capitais externos insaciáveis com o infortúnio dos demais.
Por aqui, ainda se recorda o colapso do Banco do Fayal, pela perda das pequenas poupanças que a falência ocasionou. Fala-se também da crise na indústria de conservas de atum que gerou a falência de pequenas sociedades, proprietárias de traineiras.
Os tempos mudaram, é verdade! Apesar de tudo, nunca se viveu tão bem como agora, livres de fomes e de desgraças que levaram à emigração milhares e milhares de açorianos (nos finais da década de 60, saía do arquipélago, mensalmente, o equivalente a uma freguesia de 1.200 pessoas).
Alguns deles estão a regressar à América e ao Canadá.
No Aeroporto do Pico, enaltece-se os melhoramentos, mas critica-se a falta de condições no interior da aerogare, onde o calor é insuportável, apesar do edifício estar preparado para o ar condicionado.
Num balcão da SATA, já foi instalado esse equipamento, após desmaios e protestos dos trabalhadores que suportavam temperaturas, três graus acima da temperatura exterior.
Há uns anos, sobre isso, lavrei um protesto no livro de reclamações. Respondeu-me a SATA endossando ao Governo a responsabilidade.
É para ele que dirijo, agora, esta reclamação pública, ciente de que os picoenses serão, rapidamente, atendidos como tem sido noutras situações.
Provar-se-á, então, que a gestão política da causa pública não pode ser efetuada por contabilistas encartados, mas por governantes sensíveis ao bem-comum.
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